O Meu Chão é de Vertigem

22.26

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Descrição

Quando pela primeira vez ouvi falar de Maria Eulália de Macedo, aquando da sua morte, aos 90 anos, em dezembro de 2011, percebi apenas que seria alguém que vivera entre Pascoaes e o Marão, amiga do Poeta, que escrevera algo, talvez pouco para a sua longa vida, mas muito para o pouco ou nada do que eu dela conhecia. José Rui Teixeira, uma vez mais, abriu o caminho. E agora, que recebo este “O Meu Chão É De Vertigem” (obra completa) de Maria Eulália Macedo numa cuidada edição (mais uma), da Officium Lectionis descubro nas suas 326 páginas, uma vida poética em forma de livro. E sei que quando alguma vez me pedirem para referir um pequeno texto ou narrativa, dos mais belos que tenho lido de há muito, muito tempo, não terei dúvidas em escolher “A Terra-Dos-BIchos-De-Conta”, três páginas de prosa poética, nostálgica, antológica.
“… As personagens desta história não são homens nem mulheres – que ali nem os homens nem as mulheres tinham história. A esses ninguém os via. Saíam de casa ao anoitecer com um candeeiro apagado na mão e uma saca de pano sujo onde levavam boroa. As mulheres eram sombras escuras. Vestiam sempre de luto – roupas de lã, por mais calor que fizesse. Eles e elas eram mudos. Lembravam cães, quando os encontrávamos no caminho, porque seguiam depressa e rosnavam qualquer coisa, se lhes falávamos…
… Mas esta não é uma história de homens e de mulheres. As personagens são outras. São o cheiro e a podridão que fertilizam e alimentam aquelas terras. É o vento do lado do mar e o toque de sinos a defunto todos os fins de tarde. Lá as coisas eram tudo. Elas é que reinavam nesse mumdo de sombras humanas. A lama, o carvão, as fábricas, a mina poluíam o ar…
… Lá morria-se cedo. A mina e a fábrica eram ciosas dos seus direitos e a tuberculose e a silicose faziam a sua obra. Os homens morriam antes dos quarenta anos. Talvez por isso aquela gente gostava dos cemitérios, das campas enfeitadas com retratos, imagens e flores de papel; o cemitério era o único lugar de diversão, o sítio onde cada qual afirmava o que era e quanto tinha. Havia jazigos ricos nessa terra de casas pobres e sem conforto…”, A Terra-Dos-Bichos-De-Conta, in Construção no Vento Norte

1.ª ed.: outubro 2021
160 x 235 mm | 336 pp.
ISBN 978-989-8029-94-2

Obra completa
Edição: José Rui Teixeira e Jorge Teixeira
Introdução geral: José Rui Teixeira
Textos prefaciais a Histórias de Poucas Palavras e As Moradas Terrenas: Maria João Reynaud
Imagem da capa: ilustração de Gabriel Pacheco

 

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Maria Eulália de Macedo

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